Oficina de escrita (V)

Acordo. Sinto-me estranha...
O que se passa comigo? O que se passou ontem?
Sinto que algo não está normal.
Olho em volta. Tudo encontra-se no seu devido lugar. Então porque sinto esta sensação?
Olho para uma das minhas mãos. Cinco dedos. Nada errado aqui. Olho para a outra. Cinco também. Em cada pé a mesma coisa. Acho que estou inteira.
Entao porque sinto que falta algo em mim?
Levanto-me. Olho-me ao espelho.
Estou magra. De olhos inxados. Pareço ter andado a chorar. Mas...andei?
Não me recordo de nada. Será amnésia?
Não creio. Lembro-me de tudo o que vivi, apenas não recordo os promenores dos dias anteriores a este.
Examino-me cuidadosamente. Sim, parece estar tudo no lugar.
Volto para o quarto. Sento-me na cama. Olho em redor.
Lembro-me desta divisão estar muitas vezes iluminada, embora agora pareça-me escura e sombria.
É dia e o sol entra pela janela semi-aberta. No entanto, o quarto não deixa de parecer frio e escuro.
Algo chama-me a atenção. Olho para o chão. Uma moldura, envolta em vidros partidos encontra-se voltada de face para baixo no chão do meu quarto. Agarro nela. Viro-a.
É isso. A explicação de tudo.
De rompante todas as memórias perdidas enchem a minha cabeça, fazendo-a doer.
Já sei o que falta em mim. Já sei o que está errado. O que falta neste cenário. A luz que falta na minha vida, para iluminar os meus dias...
Em mim falta o coração, por ti levado ao me deixares em profunda tristeza, aqui sozinha. Faltas tu, com o teu sorriso luminoso, para irradiar alegria ao lugar a que chamo casa. Faltas tu para com esses olhos lindos e penetrantes me encheres a vida de amor e felicidade.
Levaste o meu coração contigo e não hesitas-te em parti-lo em mil pedaçinhos tal como a moldura.
Ambos partidos. O que me resta agora?
Resta-me uma fotografia do teu sorriso luminoso e dos teus olhos penetrantes, que para sempre penetraram na minha alma e me deixaram assim. Estranha. Oca. Vazia.
De olhos inxados.
Por não te ter.